Desaposentação já vira realidade na Justiça Brasileira.
Enquanto não sai a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre
o direito à troca de aposentadoria, trabalhadores conseguem a chamada
desaposentação em outras instâncias da Justiça.
A desaposentação permite que o trabalhador já aposentado que
continua trabalhando possa se aposentar de novo com um benefício que inclua as
novas contribuições à Previdência Social.
Estima-se que existam hoje 182 mil ações na Justiça com esse
objetivo, muitas paradas à espera do Supremo –o órgão precisa estabelecer
jurisprudência para situações semelhantes.
O novo Código de Processo Civil, aprovado pelo Senado em dezembro
de 2014, trouxe uma nova possibilidade de análise da questão, de acordo com
João Badari, advogado especializado em direito previdenciário da Aith, Badari e
Luchin Advogados.
Antes, os advogados entravam com pedido de antecipação de tutela
em nome de seus clientes, para que o novo benefício fosse pago antes de
acontecer o julgamento da desaposentação.
SEM
TEMPO DE ESPERAR
A tutela antecipada permite implementar, antes do julgamento da
ação, os efeitos da sentença devido ao caráter de urgência do que é solicitado.
Ela se baseia no princípio da necessidade –o aposentado não pode esperar pelo
tempo do processo para receber o benefício.
Agora, os advogados recorrem à tutela de evidência, que não exige
esse caráter de emergência para antecipar o pagamento do que é requerido
judicialmente –o faz apenas com base nos documentos do processo.
“O artigo 311 do novo código permite que o juiz conceda uma
liminar a favor da desaposentação apenas com as provas documentais, sem a
necessidade de um caráter de urgência”, diz Badari.
OPERADOR
DE MÁQUINAS
A tutela de evidência foi base para a nova aposentadoria de um
operador de máquinas de São José dos Campos (SP). Ele entrou com a ação na
Justiça Federal em abril e conseguiu a desaposentação em 15 dias.
Ele havia se aposentado em 1997, após 30 anos de contribuição.
Recebia um benefício de R$ 2.333,35.
Porém, continuou trabalhando até 2008, e, pelo parecer judicial,
passou a ter direito a um valor mensal de R$ 4.422,51 pelo INSS.
É o primeiro caso de desaposentação concedida com base na tutela
de evidência, segundo Badari.
“Tenho clientes recebendo a nova aposentadoria [pela tutela
antecipada] desde 2011″, diz o advogado.
RISCOS
Pedir a revisão da aposentadoria pode trazer problemas para o
trabalhador, segundo advogados.
O primeiro deles é a possibilidade de a Justiça entender que, uma
vez que passe a receber um novo valor de aposentadoria, o beneficiado precise
devolver as quantias que já recebeu pelo cálculo anterior.
Outro problema antecipado por especialistas é a possibilidade de o
aposentado precisar devolver ao INSS o adicional recebido no benefício com
decisões de primeira instância, caso o STF não aprove a desaposentação.
“A probabilidade de isso acontecer, no entanto, é pequena, pois o
direito previdenciário é interpretado como verba alimentar”, afirma a advogada
Luciana Moraes de Farias, presidente do Conselho Federal do Iape (Instituto dos
Advogados Previdenciários).
“O Código Civil considera que os valores usados para as despesas
do mês, com alimentos, vestuário e moradia, por exemplo, não podem ser
devolvidos”, afirma.
CÁLCULO
DO VALOR
Antes de entrar com uma ação, o aposentado precisa calcular o
valor a que teria direito com a desaposentação, para verificar se de fato
aumentaria o benefício.
“O cálculo deve ser feito por um profissional especializado em
direito previdenciário ou por um contador especializado em normas
previdenciárias, uma vez que é preciso saber interpretar a lei”, afirma a
advogada.
Segundo ela, um maior tempo de contribuição pode não ser
suficiente para que a nova aposentadoria seja maior que uma que tenha sido
realizada antes da instituição do fator previdenciário, em 1999, por exemplo.
“Além disso, um dos ministros do Supremo, Roberto Barroso, sugeriu
uma nova fórmula de cálculo para a desaposentação, e não sabemos exatamente
como isso vai ficar”, afirma Farias.
ENTENDA A DESAPOSENTAÇÃO
Benefício é contrapartida para contribuições do aposentado que
continuou trabalhando
1. O que é desaposentação?
Pedido do recálculo da aposentadoria, levando em consideração as
contribuições do trabalhador para a Previdência depois que ele se aposentou
2. Quem pode pedir?
Trabalhadores que, depois de aposentados, continuaram trabalhando
formalmente e contribuindo para a Previdência, como empregados ou autônomos
3. Como se pede?
Por meio de ação judicial no Juizado Especial Federal (não é
necessário advogado nesse caso) ou nas varas previdenciárias, onde as custas
processuais são de 1% do valor da causa
4. Qual o princípio do direito à desaposentação?
Pelo princípio constitucional da contrapartida, a contribuição do
trabalhador aposentado com a Previdência requer em troca um benefício.
Os advogados entendem que salário-família, salário-maternidade e
reabilitação profissional, já garantidos por lei para quem segue contribuindo,
são insuficientes para fazer valer o princípio
5. Qual o impacto da desaposentação para o INSS?
Estima-se que, se aprovada pelo STF, a desaposentação custe R$ 181
milhões para os cofres do INSS nas próximas duas décadas
6. Por que o STF ainda não julgou a desaposentação?
Há uma questão política envolvida. A medida traria grande impacto
para a economia, e sua repercussão no que diz respeito à imagem do governo
neste momento poderia ser negativa
7. O que mudou com o novo Código de Processo Civil?
Ele instituiu a tutela de evidência, instrumento jurídico que
passou a ser usado nas causas de desaposentação. Ele permite que o benefício
comece a ser pago antes do julgamento, com base em provas documentais
8. Qual é a diferença da tutela de evidência para a antecipação de
tutela?
A tutela de evidência difere da antecipação de tutela porque, ao
contrário desta, que também é usada nesse tipo de processo, não é necessário
provar caráter de urgência para receber o benefício. Assim, não faz diferença
para a Justiça se o aumento da aposenta-doria do requerente é imprescindível
para a sua sobrevivência imediata. (por Advocacia-Geral da União e
Luciana Moraes de Farias, presidente do Conselho Federal do Iape – Instituto
dos Advogados Previdenciários)
Fonte: Folha de São Paulo, por Edson Valente, 01.07.2016
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